Há 75 anos ninguém conhecia o Encruzado no Dão. Porém já existia, sendo também conhecido por Salgueirinho, mas surgia quase incógnito entre as cepas da região, não se lhe reconhecendo méritos de monta. Foi graças ao trabalho pioneiro de Alberto Cardoso de Vilhena, no Centro de Estudos Vitivinícolas do Dão, que os dotes da casta foram deslindados e reconhecidos, passando lentamente de um quase anonimato para a primeira linha das grandes castas portuguesas. Quem teve a sorte de provar os brancos do “Centro de Estudos” e, particularmente, as míticas colheitas de 1962 e 1974, percebe de imediato a dimensão da casta. Porém, quando além disso se sabe que essas colheitas foram vinificadas sem controlo de temperatura de fermentação, sem leveduras selecionadas, sem enzimas, sem gases inertes e sem cubas de aço inox fica-se sem palavras e rendido à genialidade do Encruzado. Se a casta é sublime enologicamente também o é ampelograficamente, pois tem uma característica morfológica extremamente rara entre as videiras, que é ter gavinhas nos entrenós e não nos nós das varas, como é a norma.
Talvez seja essa a razão para o povo a ter batizado com o nome que hoje todos os enófilos portugueses conhecem. Os méritos da casta são variados, mas o que a torna única é a beleza discreta dos seus vinhos, o seu aroma enigmático e desafiante, que se vai intensificando e complexificando com o tempo de garrafa, o equilíbrio que mostra na boca, onde a acidez refrescante e a complexidade do flavor conferem um final sumptuoso. Não surpreenderá, por isso, que os verdadeiros apreciadores só comecem a beber o Encruzado a partir do terceiro ano e se emocionem quando as garrafas são abertas ao fim de dez, vinte ou, mesmo, cinquenta anos, como na já referida colheita de 1962. Presentemente é a grande embaixadora dos vinhos brancos do Dão, que atingem verdadeiro padrão internacional.
O consumo do vinho do Dão
nas casas senhoriais da região.